Site Meter Projeto Modes - Encheu? Joga Fora!: 2010

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Cine (de amor) Privê



Cena 1

A mão entre os lábios molhados de tesão era o início da noite que ele esperava a tanto.

Seu músculo tocando de leve na perna quente que conhecia de olhos fechados.
e que tremia toda vez, quando sentia prazer.

Não era como uma falta qualquer, era uma necessidade incalculável... por uma penetração absolutamente...



Profunda.

***

Chegou tarde do escritório naquela quarta-feira tediosa.

A cabeça pesava enquanto o olhar analisava o quarto e buscava alguma urgência, mesmo sem existir.

Entrou no chuveiro e se aliviou pensando em tudo mais uma vez. Foi passando a toalha devagar, cheia de vontades enquanto andava até a cama.

Desistiu de assistir qualquer filme.

Sabia que ia dormir e sonhar com uma cena de amor (pornô), cheia de detalhes, igual aquelas contadas também nos seus livros.

Acho que acabou abrindo um sorriso no canto da boca durante o sono.

Logo o filme teria sua estréia real.



Mesmo sem sucesso de bilheteria.
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domingo, 25 de abril de 2010

Mudanças - Capítulo IV

O celular tocou uma hora mais cedo, propositalmente. Ela abriu os olhos e se deparou com ele, ainda na mesma posição de quando se deitou. Cabeça apertando o travesseiro, a boca um pouco aberta, numa respiração que mais parece um assovio, e a mão direita imóvel em cima da própria barriga. Reparou na semelhança que todos os homens têm ao dormir pesadamente e, sem saber por que, se lembrou de um fim de tarde em Itacaré, lá pros seus 25 anos, em que dormiu na rede com o seu amor daquele ano. Debaixo do calor baiano, uma mão direita que também ficava imóvel durante todo o sono, mas que engraçado, pensou, como ainda se lembrava daquele filho da puta que logo se engraçou com uma ruiva um tanto mal vestida.

Memórias. Sempre inconvenientes.

Levantou-se da cama e voltou para aquela realidade, não menos dolorosa. No bilhete, escreveu que ainda sentia o cheiro de todos os bons momentos, mas que noites assim não apagam o maldito sentimento que mistura rancor à saudade. E que a Giovana andava perguntando bastante pelo pai, ele devia ligar mais vezes.

Antes de sair, olhou mais uma vez aquele homenzarrão na cama que já despontava a meia idade. Por mais que a vontade fosse de passar o resto da tarde ali ao seu lado, queria mesmo era mandá-lo à merda. Sente raiva por momentos assim de fraqueza, a culpa é sempre do outro, inventa.

Fechou a porta e chorou. Nunca soube resolver esse problema, se engana sempre, tapa com a mão um sol que teima em nascer todos os dias, se humilha. Precisa mudar um destino que de tanto dar voltas cai no mesmo lugar. Ela sabe.

“Eu sou puta”, soluçou no corredor vazio.

Olhou a agenda e se deu conta de que é sábado, já tem um cliente marcado, deve ir pra casa logo. Ela ainda tem uma surpresa para o dia de hoje. Mas não sabe.

Rosana, 43, prostituta, mãe, amante, infeliz e, claro, profana.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Lulina - Meu príncipe

segunda-feira, 29 de março de 2010



Falei sobre você com o espelho, enquanto o lápis deixava um risco preto nos olhos castanhos. Lembrei do sorriso que apareceu igualzinho, como se eu o tivesse visto em exatos cinco minutos. Escutei sua voz no meu ouvido esquerdo e senti o calor da sua mão na minha cintura como se você estivesse ali, naquele instante.

Peguei o rímel quase no fim e aumentei os cílios que já são longos. Por pura vaidade. O cabelo estava de bom humor, as unhas feitas. A ausência do batom continuava, apenas um pouco de gloss que sairia nos próximos dez minutos. Enquanto passava senti seu beijo pelo ar quente que invadiu meus lábios.

Encaixei o pendrive no som para passar o tempo, a primeira faixa da pasta era aquela. O sonho com os olhos abertos era tão real que eu podia ouvir sua voz cantando com empolgação o refrão que tanto se repetia. Eu acompanhando como sempre, eu e você, você e eu e assim sucessivamente.

Por fim, espirrei o perfume de um lado do pescoço. O lado oposto sentiu seu nariz encostando devagar na pele enquanto eu sentia a sua. Quente, sem perfume. Só com o seu cheiro que ainda me pertencia. Terminei. Sentei. Ainda fiquei alguns minutos quieta, pensando em tudo que havia acabado de acontecer comigo. Em sonho.

...

Escutei a porta do carro bater lá embaixo.
Sem nem hesitar, meu rosto se ergueu num sorriso cor de saudade.
E mesmo depois de tanto tempo, eu consegui.




Meu mais perfeito dejavú.




...

terça-feira, 23 de março de 2010

Passarinho verde

Dá raiva quando uma pessoa se sente mais importante do que ela realmente é. Claro, para alguém no mundo ela deve ser a pessoa mais importante.
Só que para mim não.

Não.

E não!



Vá te catar. (por gentileza?)

quinta-feira, 11 de março de 2010

Castanho médio

Lembro que quando adentrei o quarto do hospital, meus olhos ignoraram todo aquele cenário branco-dolorido, as sondas e soros e fixaram-se no que, pra mim, foi impossível não se hipnotizar: o seu olhar. Era um olhar diferente, penetrante, que me fitava por minutos e que me forçava naturalmente a se mostrar ali presente, naquele momento, mesmo que fosse para segurar sua mão e tentar te distrair com casos rotineiros.

Engraçado que esse olhar andou comigo por muito tempo, em minhas memórias. Uma outra vez na praia, em meio a uma conversa banal - acho até que nem se lembra -, você parou por um instante, se voltou pra mim e arriscou um olhar que me lembrou aquele lá. Foi rápido, mas o suficiente para eu guardá-lo também na minha coleção de olhares.

E daí que anos depois te vi em um bar, daqueles com roda de samba. Nos intervalos dos meus chorinhos preferidos, me permitia escapar para observar você, mesmo que de longe. Através do meu campo de visão, contornei todo o seu rosto, esperei os momentos em que você se virava para falar com alguém só para não perder o momento de flagrar um olhar. Mas não houve nem sinal. Tenho certeza que aquele seu olhar continua ali, pronto para ser exposto em ocasiões escolhidas a dedo. Mas, lamento, eu nunca mais vou encontrá-lo.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Contagem

Muita calma nessa hora enquanto tudo parece turvo, embaçado, difícil de enxergar, como uma imagem virtual na conversa entre risadas num domingo que sempre se repete.

Segundas, terças, quartas.

Próximo fim de semana, paciência para a chegada das definições, dos rumos, da falta de preocupações eternas. Rua, cabeça tranquila, cerveja.

Sextas, sábados.

Acordo no domingo morno na esperança de mais uma semana que nasce fria.
Importa-me o querer. Importa-me o amanhã melhor.

Sempre.








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domingo, 7 de fevereiro de 2010

Unidos de Vila Isabel

Martinho da Vila tem 72 anos, escreveu dez livros e até hoje toma cerveja petiscando jiló no seu bairro carioca preferido: Vila Isabel.
Em 1965, fundou a escola de samba Unidos de Vila Isabel e, para este ano em especial, fez questão de compor o samba-enredo.

Uma homenagem ao centenário do nascimento de outra figura ilustre.

Com vocês, Noel Rosa.



Se um dia na orgia me chamassem
Com saudades perguntassem
Por onde anda Noel
Com toda minha fé responderia
Vaga na noite e no dia
Vive na terra e no céu
Seus sambas muito curti
Com a cabeça ao léu
Sua presença senti
No ar de Vila Isabel
Com o sedutor não bebi
Nem fui com ele a bordel
Mas sei que está presente
Com a gente neste laurel

Veio ao planeta com os auspícios de um cometa
Naquele ano da Revolta da Chibata
A sua vida foi de notas musicais
Seus lindos sambas animavam carnavais
Brincava em blocos com boêmios e mulatas
Subia morros sem preconceitos sociais

Foi um grande chororô
Quando o gênio descansou
Todo o samba lamentou
Que enorme dissabor
Foi-se o nosso professor
A Lindaura soluçou
E a Dama do Cabaré não dançou
Fez a passagem pro espaço sideral
Mas está vivo neste nosso carnaval
Também presentes Cartola
Araci e os Tangarás
Lamartine, Ismael e outros mais
E a fantasia que se usa
Pra sambar com o menestrel

Tem a energia da nossa Vila Isabel

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O ato de se alimentar


Coma por inteiro a vida,
mastigando bem forte aquele encontro indesejado,
teu chefe viado
e seu bolso furado.

se arrependa do abraço não dado.

mas só devolva meu copo trocado.

coma a vida.

coma.

sábado, 30 de janeiro de 2010

50 reais – Capítulo III

"O pior na historia toda é fazer 41 anos repensando no futuro, sabendo que tudo vai começar do zero em questão de meses. A maior tristeza para uma mulher é quando seu orgulho fica ferido, pior do que abandonar o marido ou saber que a filha de 14 anos faz mais sexo que você. Claro, ninguém quer ter dor de cabeça em casa, mas levar um pé na bunda do amante dói mesmo. Porque amante não pode ir embora, pô, ele nunca veio. Ele é uma aventura, sem data de validade. Tem que estar ali, tem que estar, tinha que estar".

Se o inverno se encerrou da mesma forma como começou, Rosana não percebeu. Imediatista, nunca prestou atenção em quantas noites passou em claro ou em quantos aniversários da Giovana o Edson não apareceu. Mas sabe que não sabe recomeçar. Ou pelo menos não sabia até aquela noite.

Desde que foi demitida, deixou de lado os scarpins, almoços no Rubaiyat, paetês e cartões. Teve que aprender a montar seu próprio currículo - outro chefe atraente não vai lhe bater à porta. Tomou mais um gole de wisky. Meias arrastão chamam atenção, pensou ela. Abriu o diário mais uma vez: “Hoje é o primeiro dia do começo da minha vida. Ou do fim dela.”

Botas e pálpebras negras. Abriu a bolsa, conferiu o RG e o maço de cigarro. Se assustou com a rapidez com que um carro parou ao seu lado e com a necessidade que sentiu em atendê-lo. Apoiou na janela do veículo e, numa fração de segundo, observou tudo. Papéis de semáforo no banco traseiro, aliança na mão esquerda, celular no colo, barba.

- 50 reais.

Um uno vermelho não é bem o que ela esperava para aquela noite, embora já estivesse conformada com os altos e baixos de uma nova profissão, mesmo que num primeiro dia.

Rosana, 41, adúltera e profana.